23 março 2008

A última dança



Entrelaçada em sua mão esquerda, a direita.
O vai, vem
apaziguado;


Na vitrola das valsas, a melhor:
Não se soube mais para onde foi
levado.


18 março 2008

Um Rio Sem Pressa

Eram sábias, as duas gurias. De uma forma ou de outra, elas possuíam o básico e até o intermediário. E seguiam. Davam saltos diferentes, pra lados meio opostos (oposição meia tigela) mas que não as impossibilitavam de voar na mesma direção. Momentos. Agora sabiam o valor de todos eles. Todos que passaram até ali. Havia muito mais a descobrir e, isso elas pareciam tirar de letra. Letras. Muitas delas. Um alfabeto construído pra transparecer o que havia de ser dito. Que abandonem os velhos costumes e a acentuação barata. Ali em frente, aos olhos delas, o anseio era sempre mais. Criavam ilusões. Na doçura do encantamento prolongado, elas deslizavam na corda bamba que nunca nos trás um ponto final. Era o início. Transcorrem diálogos na madrugada. Há distância. O zum zum zum praiano ouvido lá, em nada se compara à lúdica calmaria do Guaíba, daqui. E lá foram elas. Saíram pra passear, deram-se as mãos, vem comigo que eu tô contigo, não larguei, não. E foi bom. Compartilharam as vidas no presente. Um passado vivido em tempo cronológico não faz suas cabeças. Aliás, o tempo passa só pra levar as folhas amassadas embora. Reciclaram-nas. Mutantes em busca do movimento colorido, risos e choros e falhas e bons dias as esperavam. Corrida diária em busca. Busca vida. Prazer em conhecer. Ser para aquilo que se nasce. Envolvidas na delícia e no medo da prática dos projetos, seguiam. O trapézio fez o trajeto de volta. Não coube a mim agarrá-lo, mas a ela. Um salto. Voltei. Pé no chão. Visamos o alto de nossas realidades flutuantes. Como espumas. Soubemos as verdades que não foram ditas. Palavras, as letras aqui e novamente. Vozes que se encontraram em rápidos momentos oportunos. Um gole na garrafa errada e uns cigarros consumidos. Voltemos agora ao princípio do envolver-se: deixei de lado velhos papéis. Assumi um inspirado nariz de palhaço. Vermelho e lúcido. Chamei Neruda no cantinho e confessei que mais uma vez, eu vivi.

14 março 2008

Dr. Fantástico ou Como aprender a amar os gritos entusiasmados das crianças nos parques

*
Cantemos Erasmo no início: "Eu preciso de ajuda. Por favor me acuda. Eu vivo muito só. Eu me sinto muito só. Mas se acaso numa curva, eu me lmbro do meu rumo, eu piso mais fundo, corrijo num segundo. Não posso parar."
E pra mim é assim que inicia o fabuloso ("essa é a palavra") monólogo Parque de Diversões, que fui assitir ontem, no espaço Ox do Ocidente, aqui em Porto Alegre.
Pra falar bem do que foi visto - e, principalmente, ouvido (não precisamos ver, de verdade) - é necessário fazer algumas ressalvas. Prepare-se pra adentrar em um ambiente fatidicamente sinistro, onde camas, cinzeiros e livros são propositalmente jogados para a frente. As cinzas caem no chão, quase que sujando as delicadas meias pretas do rancoroso personagem.
Um asqueroso ruído de uma roda gigante aparentemente abandonada e muito antiga é proposto e enfiado tímpanos adentro. Nada que uma projeção de pontinhos-brancoscoloridos-absurdos num telão não menos absurdo não amenize.
O problema é quando as rodas iluminadas giram ao teu redor e tu não tens pra onde fugir. É preciso ouvir até o fim. O drama hilariante e trágico do cara que fala ao microfone é poesia mórbida, feita no melhor estilo improvisado de uma voz distorcida e amendrontadora de um ser que não dorme há 34 dias.
Ainda assim, o silêncio vale ouro.
Interagindo contigo o tempo todo, é traçado um objetivo desvirtuado de uma insana (e insone) vida nada pacata. O foco escuso e sombrio das palavras encenadas - ou não, perde-se a noção da meia realidade enquanto se está ali - te remete a uma ânsia vazia de desespero surdo. Espere pela morte que não vem. "Como é o fim? Não tem".
A inércia descabida espelhada em um outro-eu é um complicador alucinante. E não há meios de escapar dessa conclusão. O que se vê é a perda gradual do espelho da própria face, oculta em um discurso psicosimpático (definido por ele mesmo, certa vez) sem fim.
Vaza um dilema corrosivo. O louco entra em cena. Um delírio perfeito da mente deturbada de quem não lê mais o jornal que chega todo o dia é anunciado. E para que, mesmo? Pois "a sorte não vem nos jornais". Tá certo. Rá! Delicie-se com um final visualmente melancólico, onde as expressões modificam o que até então, parecia imutável. E saia com a sensação e a angústia barata de pensar em lojas-de-doces-abertas-aos-sábados.
Repito: fabuloso. E não o destino de. Pois esse já fora perdido desde a primeira baforada no cigarro mau fumado.

12 março 2008

No tom, na síntese. Sintonize-se

nos braços ventiladores que

somente cortam o ar dos que não

dançam conforme qualquer música.

08 março 2008

Enquanto isso se sucede

Aconteceu como havia de ser. Sem mais nem menos. Na verdade, ainda acontece. Não chegamos no passado e, olha, nem sei se ele nos alcança em tempo. O bom mesmo é o balde cheio de história misturada com as roupas pra lavar. Já saiu tanta coisa dali que ainda me flagro divagando o que de bom deve está por vir. Por certo é uma linha longa, nada de ordinariedades dessa vez, certo? Talvez seja a hora de partir pra lavação. Das palavras, claro. Abrir a torneira vocal e partir pro abraço. Assim mesmo, no melhor estilo narração de jogo de futebol. As roupas podem esperar.